14.4.19

11. O cordel estradeiro

Meu primeiro due tone: Cordel do Fogo Encantado por Jornal Portal do Sertão
Aqui é cantado um nordeste que alguém poderia até dizer romantizado, mas acredito que seja algo mais profundo: um fragmento de nordeste real interligado fortemente com o seu passado, passado do nosso Brasil. Assim como podemos ver em Interestelar, uma sobreposição de temporalidades no eterno presente.

Tenho lido Sérgio Buarque de Holanda, estudado Gilberto Freyre, refletido minha própria visão sobre a terra dos meus pais a partir das incongruências, complexidades e paradoxos dos referidos autores, lembrando de conversas com minha irmã, e de representações do Nordeste em outros locais, como o Sudeste, de quem sou filha (por ocasião, e não por merecimento). Peguei aqui Os sertões para me inspirar de alguma forma e ter o que citar e o que dizer... Mas eu apenas digo a vocês que meu Nordeste é uma Macondo brasileira. Não por imitação, já que o Nordeste é o lugar mais original deste mundo. Original por ser atemporal.

Este, por mais que não seja o, é um nordeste. Nós possuímos fragmentos de um passado colonial, e mesmo feudal, ainda vivos no presente. Não só herança moura, européia, mas africana, americana. Fortemente. Algo que, por mais que a globalização o imperialismo avance, de alguma forma ainda não foi perdido. Está no Maracatu, relembrado no manguebeat, está nos artesanatos que os gringos e os paulistas adoram comprar, mas que não calam sua xenofobia por aí. Está nas igrejas tricentenárias, nos engenhos persistentes, nas memórias dos meus (nossos) pais, tios, avós. Nos filmes de cangaço, nos sertões de Euclides, nas Vidas Secas de Graciliano, nas Bahias de Jorge Amado, no cheiro da terra, lenha, gado, borralho. No som do chocalho. Nos juazeiros e umbuzeiros. No céu aberto e escancarado, caindo sobre nossas cabeças. No r rasgado, na polidez do vocabulário, na genialidade do repente, na talhada dos cordéis, da Pedra do Ingá, da Boca, do Lajedo de Pai Mateus, nas Trilhas de Sumé. Na Paraíba masculina (sim) mulher-macho (sim) sim, Senhor!
Eu também sou cangaceiro
E o meu cordel estradeiro
É cascavel poderosa
É chuva que cai maneira
Aguando a terra quente
Erguendo um véu de poeira
Deixando a tarde cheirosa
11. a song that you never get tired of (uma música da qual você nunca se cansa)
Cordel do Fogo Encantado é uma banda teatral - "um grupo cênico-musical, compartilhando o teatro e a poesia oral e escrita dos cantadores e ritmos afro-indígenas da região" - nascida no ano de 1997 em Arcoverde, Pernambuco. Conheci ano passado, provavelmente porque Lirinha, o vocalista, é componente da trilha sonora de Lisbela e o Prisioneiro. Curiosamente, na mesma semana em que conheci a então falecida banda, eles voltaram! E com tudo, parece.
"Cordel" é sinônimo de história de um povo em forma de poesia.
"Fogo" é o elemento mais representativo do lugar de origem e da intenção músico-poética inconstante e mutável do grupo.
"Encantado" ressalta a visão fantástica e profética dos mistérios entre o céu e a terra.

Leia os outros textos do 30 day music challenge aqui.

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Tema base por Maira Gall, editado por Helen Araújo