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Faz bastante tempo que não escrevo por aqui, mas não significa que não estou escrevendo: apenas mudei de endereços, ou os acumulei. Quero muito ainda cultivar este blog que, descobri lendo um diário meu, começou em outro link precisamente no dia 01 de janeiro de 2008. Olha que coisa! Dezesseis anos blogando. Deve haver gente que desconheço me lendo desde então.
Como é sabido, quase abandonei esta conta, não fosse Vanessa e o Blogueiros Raiz, e mulheres que vieram dizer que me liam, e fiquei encantada e encorajada a continuar. Hoje em dia tenho escrito muito, muito mais, com mais coragem e comprometimento. Com reescrita, coisa que eu era contra com meus dezesseis aninhos crus. Escrever é reescrever, esquecer, se surpreender e escrever de novo. Por isso tanta repetição dos mesmos temas, mas nunca num jogo de palavras iguais.
Bom, o Blogueiros Raiz projetou no fim do ano passado um amigo secreto, onde enviaríamos e receberíamos cartinhas manuscritas. Um evento imperdível, já que eu não escrevia cartas desde criança. Era meu modo de treinar a escrita recém-aprendida. Agora, além de trocar cartas entre blogueiras, também faço entre amigos. Quero ter grana para ter uma Caixa Postal e poder compartilhá-la com desconhecidos também. O gênero carta é sensacional.
Falo somente agora do Amigo Secreto, porque eu fui aquela que dizem na bíblia: a humilhada que foi exaltada. Não, nenhuma blogueira me humilhou: foram os Correios mesmo. Entendo a necessidade de que ele seja público e estatal, sou a favor disso. O Brasil foi o segundo país do mundo a ter um sistema de selos, o primeiro foi a Inglaterra. Sabiam disso? Graças ao Imperador amigo de Jules Verne, o D. Pedro II. Sou comunista e contra qualquer tipo de monarquia, mas também sou madura o suficiente para considerar esta uma personalidade brasileira notável, e ele seria mesmo um professor o cientista, caso não fosse destinado à Coroa. Era sua vontade íntima, na verdade. Enfim.
Divaguei e atraso a explicação, assim como os correios atrasaram em quatro meses a chegada da minha correspondência. Moro afastada do centro da cidade de São Paulo, numa região que pode (ou podia, há alguns anos) ser considerada rural. Sim, existe roça em SP. Afastada como o título da minha monografia, inclusive. Sabiam também que a Zona Leste da cidade de São Paulo possui mais moradores que a cidade de João Pessoa e São Paulo inteira, mais que a Bélgica? Por isso esta Metrópolis possui o agravante da desigualdade social. Eu sou uma das afetadas economicamente, e também em políticas públicas. A lógica do capitalismo é favorecer os capitais e desfavorecer os marginais. Então a Sé recebe suas correspondências corretamente, assim como o Jardim Europa. O mesmo não pode ser dito de São Mateus e outros bairros considerados de "risco", então os carteiros, mal pagos, sucateados etc. (e às vezes malandros, convenhamos, tenho meus poréns com funcionarismo público sim, como uma boa kafkiana com horror a burocracia), recorrem a desculpas e brechas burocráticas. Curioso é meu livro favorito do Franz ser O Processo.
Os carteiros costumam dizer que ninguém os atendeu, que vieram três vezes seguidas, que o endereço está incorreto. A realidade: trabalho em casa e saio pouquíssimas vezes, o endereço está correto, ninguém me chamou. E mesmo assim tenho que ir até o Centro de Distribuição no prazo. Mas, como o carteiro mente no app, e nem aparece com a notinha que avisa os sete dias, é possível que eu perca o prazo.
Dessa vez foi bem maluco. Minha amiga secreta não podia me dizer que me tirou, então esperou e reclamou em segredo que os correios não estavam entregando. Quando viu que eu deveria buscar a encomenda, me avisou. Eu pensei "tenho sete dias", então deixei para o dia seguinte, porque tinha compromisso. Acontece que neste dia seguinte, a encomenda foi despachada para Guarulhos. Era 6 de dezembro. E lá ficou por dois meses. Nem podia fazer reclamação na Central de Atendimento, porque ou não havia dados suficientes, ou, se os tinha, não era aquele setor para reclamar. Beco sem saída. Kafka. Até no tarot tirei para saber se receberia, ou se incinerariam. Desconfiei que receberia com atraso, depois de uma perda (a Lua estava no jogo). Desconfiei também que receberia no tempo certo que eu precisaria ler aquela mensagem, pois acredito que coisas podem ter significados maiores desta forma.
Combinamos então que se retornasse mesmo a ela, trocaríamos o endereço destinatário. E finalmente deu certo. Essa carta viajou como o gnomo de Amelie Poulain: veio para São Paulo, voltou para Pernambuco. Depois retornou a SP, chegando vizinha a meu bar de rock favorito, entregue nas mãos de um amigo de infância, que passou no Carnaval para outra amiga de infância, que é minha vizinha de bairro e finalmente me entregou. Uma cartinha que conheceu muito de minha intimidade, até chegar a mim, de fato.
Minha cartinha do Amigo Secreto Blogueiro veio do estado vizinho ao dos meus pais, e quem me tirou foi Mia do Bosque do Robin. A primeira coisa que li foi um poema de Keats, amado da minha outra amiga Mia, a do Querido Clássico, um dia antes do aniversário da morte do poeta!!!!
Enfim, um conteúdo encantador dessa artista secreta, digo, amiga secreta: desenhado, datilografado, cheio de poesia sobre minha estação do ano favorita: o Outono! Postais, seres elementais (que têm me chamado para uma conversa) que me lembram o querido Mestre Ensinador, que sou tão fã que costurei um para mim no natal. Mais uma vez: obrigada, Mia!
O Outono é a estação dos fins. As folhas caem, os frutos são colhidos, nos preparamos para o Inverno (estação em que nasci). Curiosamente (na verdade é sincronicidade), eu estou estudando as estações do ano e o horóscopo do fim do período medieval no Estúdio São Jerônimo, na série Trabalhos do Mês. É o Tempo conversando comigo sobre ciclos, sobre espera, sobre segundas chances. Elas existem. Quando algo não dá certo de primeira... é possível recomeçar. É possível embarcar em oportunidades sem precisar correr. Oportunidade é o tempo certo, Kairós. E o tempo certo pode ser preciso e pode ser fugaz, mas ele dá sim suas indicações de quando e onde. É preciso apenas fazer silêncio e escutar. E não parar no tempo: o tempo da espera é o da preparação, da gestação. Coisas acontecem debaixo das folhas secas outonais. Há vida ali. A decomposição é adubo para novas plantas, novos caules, novas folhas... Que vão cair no outono seguinte.
Falarei mais de tempo - a vida toda - na newsletter, com seu décimo-sétimo texto no dia 28. Acompanhem também minhas publicações no Querido Clássico, voltarei a publicar em breve. E no site do estúdio também. Já falei sobre São Valentim e tudo!
Quer saber quem eu tirei no amigo secreto? Pois foi ela mesma!